Estrela em Combustão
Me sentia aquecida e segura envolta por outros braços.
Não queria sair dali. Se saísse, estaria sozinha, e quando fico sozinha sei
exatamente onde gostaria de estar – o lugar envolveria braços totalmente
diferentes.
Dias tempestuosos. Literalmente. Dentro e fora de mim.
Hoje a Lua apareceu por, aproximadamente, vinte minutos. Sei porque parei duas
vezes, em dois corredores diferentes, para observá-la sorrindo.
Naqueles momentos tão curtos, pude separar emocionalmente
cada acorde tirado no baixo, correndo por meus fones de ouvido, e encaixa-lo
com um medo diferente.
Questionamentos chegam em horas pouco propícias. Os meus
chegaram com a chuva, os trovões e o vento de tempestade. Mentiria se dissesse
que chegaram sem ajuda.
Há algo desesperador, mas ridiculamente belo sobre perder
algo do qual realmente gostamos: sentido existencial. Por que estamos por aqui,
se não há nada antes e nada depois? Nada para acreditar, nada no qual segurar,
tanto materialismo ilusório... Se nada do que “temos” é propriamente “nosso”,
por que o zelamos tanto? E por que nos importamos tanto, diabos, com coisas que
perderemos de qualquer maneira?
Sabe por que algumas pessoas conseguem agarrar-se às
exatas com tanta força? Elas encontram nos números a segurança das regras, das
impossibilidades e respostas concretas. A prisão e inferno de viver como um ser
pensante e autônomo é, justamente, a liberdade eterna. Pois nem mesmo as
grades, as cordas ou as algemas aprisionam uma mente independente.
Não há regras a serem seguidas. Escolher “não escolher
nada” é estar fazendo uma escolha. Ninguém nos dirá para onde ir ou que caminho
seguir, e convenhamos, mesmo se dissesse, não o faríamos.
Nessas noites tempestuosas, quando a luz dos relâmpagos
atravessa minhas cortinas, nem o estrondo do trovão mais alto, ou a batida mais
alta dos melhores solos de trash metal consegue impedir o medo de chegar. Digo
que é o medo do temporal para ignorar o desespero cortante que me atravessa
sempre que começo a pensar. Lembrar de que não me sinto no caminho certo, ou
acompanhada das pessoas certas, ou no período de tempo em que deveria estar.
Encontro-me presa na liberdade de estar livre, e sozinha, com minha própria
mente.
Lembro de que sempre pareceu tão fácil estar perdida... Não
havia o mínimo desejo de me encaixar num grupo, num padrão específico ou
inalterável. Nunca precisei saber para onde estava indo, nem se estava ou não
perdida. O desfecho é sempre o mesmo. Há uma lança poderosa bem no fundo de
minha mente, entretanto, que diz que isso foi antes de sentir que pertencia a
algum lugar.
Tento mil argumentos contraditórios para correr dessa possibilidade.
Nenhum deles parece forte o suficiente, dado que é minha própria mente quem rebate
de volta. Por poucos dias, talvez alguns poucos meses, tive a plena certeza de
qual seria meu destino. Os questionamentos continuariam, mas, de certa forma,
sempre haveria alguém que os compartilhasse para me segurar em noites de
tormenta. Enxerguei um futuro brilhante e inacreditável que parecia estar
esperando, e também o avistei desaparecer como uma miragem no deserto. E
encontrei-me perdida. De novo.
Estive conversando com a Lua por todo esse tempo,
rebatendo medos e não obtendo resposta alguma. Dou-me conta, finalmente, de que
não é a Lua que traz as respostas. A Lua é só, nada mais e nada menos, um
planeta que gira eternamente. Dessa vez é outra coisa, chamada Mente, que
alimenta o inferno voraz dentro dela mesma, como um ciclo infinito. Como uma
estrela em combustão.